Supervisão dos finfluencers no mercado de valores mobiliários
O tema da supervisão das atividades exercidas por influenciadores integra a agenda regulatória da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que analisa, após recente consulta pública, a suficiência das normas atuais para regular a atuação dos influenciadores digitais, incluindo os finfluencers, no mercado de capitais.
Finfluencers são influenciadores digitais que fazem propaganda de produtos e serviços financeiros na rede mundial de computadores. Alguns são contratados e remunerados por agentes de mercado regulados, outros atuam por conta própria e há também perfis de inteligência artificial. Conforme artigo Fronteiras entre profissionais regulados e influenciadores digitais, há limites para a atuação dos finfluencers. Mas alguém tem o dever de supervisioná-los?
As manifestações apresentadas para a CVM na consulta pública ressaltam o dever de diligência dos agentes regulados na contratação e supervisão de influenciadores digitais. O influenciador pode não entender as fronteiras de sua atividade e, por isso, o contratante precisa estar atento.
A IOSCO - International Organization of Securities Comissions, associação internacional que reúne diversos reguladores de valores mobiliários, também recomenda que os contratantes regulados supervisionem a atuação dos influenciadores.
Em seu estudo denominado Report on Retail Distribution and Digitalisation, publicado em 2022, indica que os intermediários devem assumir a responsabilidade pela precisão das informações fornecidas a investidores potenciais por influenciadores contratados e também devem garantir a divulgação das informações necessárias sobre possíveis riscos e conflitos de interesse, para evitar danos ao investidor.
As Regras e Procedimentos de Distribuição de Produtos de Investimento da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais (Anbima), autorregulador do mercado de fundos de investimento, atribuem aos distribuidores a responsabilidade de supervisionar publicidade associada a fundos de investimento divulgada pelos influenciadores digitais por eles contratados.
A mesma linha é adotada no parecer de orientação nº 20/2023 divulgado pela BSM Supervisão de Mercados, autorreguladora dos mercados organizados administrados pela B3.
A diligência do contratante regulado deve compreender (i) análise prévia do conteúdo a ser divulgado pelos influenciadores, para assegurar a qualidade e veracidade das informações; (ii) divulgação no site dos agentes regulados sobre quem são os influenciadores por eles contratados; (iii) inclusão de aviso no canal do finfluencer de que o conteúdo é patrocinado e que o influenciador está recebendo remuneração ou qualquer outro benefício para divulgação de informações sobre produtos ou serviços financeiros; e (iv) processos adequados de rastreamento de evidências para identificar práticas abusivas e lidar com o ritmo acelerado e a natureza mutável das informações online.
Além disso, é recomendável incluir no contrato entre intermediário e finfluencers cláusulas que prevejam penalidades contratuais ao contratado, caso sejam identificadas práticas abusivas de mercado pelo finfluencer, tais como manipulação informacional, atuação em conflito de interesses ou indução de investidor a erro.
Apesar de ser factível aos agentes regulados serem diligentes na contratação dos finfluencers, há limitação informacional e prática para efetiva supervisão deles nas redes sociais, dado o dinamismo dos conteúdos veiculados. Tal limitação é reconhecida pelas próprias entidades autorreguladoras.
A dificuldade de supervisão é ainda maior sobre finfluencers que não são contratados por agentes regulados. Nesses casos, a supervisão é de responsabilidade direta da CVM, que tem competência para emitir ordens de cessação de conduta e retirada de conteúdo ilícito da rede (stop orders) e aplicar penalidades. Ocorre que, nestes casos, não há sequer o filtro da diligência de contratação por agentes regulados e a CVM não tem estrutura suficiente para supervisionar a grande quantidade de finfluencers.
Dessa forma, a solução para a questão de supervisão tem também um ângulo prático. Há oportunidade de melhoria do arranjo de supervisão dos finfluencers e até oportunidade de negócio para plataformas ou provedores de aplicações de internet, que podem fornecer soluções tecnológicas para os agentes regulados, influenciadores e para a própria CVM com a finalidade de identificar e prevenir práticas ilícitas, conforme indicamos no artigo "Autorregulação das plataformas digitais: credibilidade e valor".
Imagem: George Morina/Pexels