Reforma tributária: e as holdings imobiliárias?
Transmitir patrimônio imobiliário para uma ou mais sociedades (holdings imobiliárias) é forma eficiente de organização e planejamento patrimonial e sucessório que também pode, em determinados casos, proporcionar economia tributária relevante. Esse cenário pode mudar caso seja aprovada a “reforma tributária do consumo”, representada pela Proposta de Emenda à Constituição nº 45, de 2019 (“PEC 45/2019”), e sejam instituídos o Imposto sobre Bens e Serviços (“IBS”) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (“CBS”).
Atualmente, as receitas de locação e venda de bens imóveis auferidas pelas holdings imobiliárias não sofrem tributação pelo ISS ou pelo ICMS, respectivamente. Ademais, a depender do regime de apuração e tributação dos lucros da holding, do custo de aquisição dos imóveis e do seu valor de mercado, pode ser mais econômico receber aluguéis e vender imóveis por meio de uma pessoa jurídica, do que diretamente como pessoa física.
Esse cenário, mais ou menos estável e previsível há anos, tenderá a mudar caso o IBS e a CBS de fato sejam instituídos e venham a substituir, entre outros tributos, o ISS e o ICMS. Isso porque, da forma como idealizados e atualmente previstos pela PEC 45/2019, os novos tributos não alcançarão apenas as típicas prestações de serviços e operações com mercadorias, mas também quaisquer operações com bens materiais ou imateriais, inclusive direitos.
Significa que as holdings imobiliárias poderão ter que pagar novos tributos sobre aluguéis e vendas de imóveis, cujas alíquotas somadas, embora ainda indefinidas, possivelmente variariam, em um cenário factível, entre 25,45% e 27%1 do valor das operações. É verdade que créditos poderiam ser apropriados sobre todas as aquisições de bens, materiais ou imateriais, inclusive direitos e serviços, pela holding, mas essas sociedades costumam ter poucas despesas relevantes. É grande, portanto, o potencial de aumento de carga tributária efetiva.
Não obstante, a PEC 45/2019 abre brecha para que o aumento de tributação seja menos drástico, pois autoriza que lei complementar disponha sobre um regime específico de tributação das operações com bens imóveis, assim entendidas a construção e incorporação imobiliária; o parcelamento do solo e alienação de bem imóvel; a locação e arrendamento de bem imóvel; e a administração e intermediação de bem imóvel.
Embora ainda não se saiba como funcionaria o regime específico, a PEC autoriza a lei complementar a (i) instituir alíquotas específicas do IBS e da CBS, (ii) criar regras especiais de creditamento e de determinação da base de cálculo dos tributos2, e (iii) prever hipóteses em que os tributos serão calculados com base na receita ou no faturamento, com alíquota uniforme em todo o território nacional.
Seja mais ou menos drástico, o aumento de carga tributária para as holdings imobiliárias deverá ser gradual, já que que o IBS e a CBS inicialmente conviveriam com o ISS e o ICMS e os substituiriam aos poucos. O período de transição atualmente previsto pela PEC 45/2019 se iniciaria em 2026 e se encerraria em 2032.
Uma vez que as regras sejam definidas e aprovadas, será possível determinar em que momento dessa transição a carga tributária a que estarão sujeitas as holdings imobiliárias na locação e venda de imóveis passará a ser superior à carga tributária a que estão sujeitas, por exemplo, as pessoas físicas.
Com base nessa projeção, estruturas existentes poderão ser reavaliadas e a criação de novas holdings deverá considerar o novo paradigma de tributação.
Por ora, os incentivos permanecem os mesmos e a perspectiva de sua manutenção ainda por alguns anos pode ser suficiente, em alguns casos, para que não se alterem estruturas existentes ou mesmo para que sejam formadas novas holdings, especialmente quando razões não tributárias preponderarem.
Notas:
1. De acordo com a Nota Técnica da Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda (SERT/MF), de 8 de agosto de 2019, que trata das estimativas para as alíquotas-padrão dos novos tributos sobre o valor adicionado (disponivel em: https://www.gov.br/fazenda/pt-br/acesso-a-informacao/acoes-e-programas/reforma-tributaria/estudos/8-8-23-nt-mf_sert-anexo-detalh-metodologico-aliquota-padrao-da-tributacao-do-consumo-de-bens-e-servicos-no-ambito-da-reforma-tributaria.pdf; acesso em 9 de agosto de 2023).
2. A redação proposta para o art. 156-A, § 5º, V, “b”, itens 1 e 2, da Constituição Federal admite ainda que lei complementar preveja regime cumulativo do IBS/CBS (com alíquota reduzida, por exemplo) “em relação aos adquirentes dos bens e serviços de que trata esta alínea”. Não está claro, contudo, como essa disposição poderia afetar holdings imobiliárias que atuem como vendedoras e/ou locadoras de imóveis e também como adquirentes e/ou locatárias desses bens.
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