Redução da responsabilidade trabalhista de sócios
A superproteção dos empregados pela legislação e pelos tribunais trabalhistas é conhecida, e com frequência a potencial exposição a contingências trabalhistas preocupa investidores estrangeiros e locais. Contudo, novas leis e decisões judiciais vêm reduzindo tal risco.
A reforma trabalhista que entrou em vigor no final de 2017, trouxe maior segurança jurídica a ex-sócios, ao limitar a extensão de sua responsabilidade por obrigações trabalhistas ao período de dois anos a partir da data de retirada da sociedade.
Além disso, estabeleceu que a responsabilidade é subsidiária, ou seja, ex-sócios só poderão ser responsabilizados se a sociedade e os atuais sócios não tiverem patrimônio suficiente para garantir e/ou pagar os débitos trabalhistas. Até então, a jurisprudência considerava que ex-sócios eram responsáveis por obrigações decorrentes de relações de trabalho existentes durante o período em que participavam da sociedade, independentemente do tempo decorrido desde sua retirada, e não se discutia se a responsabilidade deveria ser subsidiária.
Outro avanço trazido pela reforma é o fato de a desconsideração da personalidade jurídica exigir procedimento específico antes de ser determinada judicialmente, dando oportunidade de defesa aos sócios e/ou administradores. A jurisprudência anterior autorizava a desconsideração de ofício, independentemente de prévia defesa por parte de sócios e/ou administradores.
De acordo com as normas que regem o direito societário, a responsabilidade dos sócios pelas obrigações da sociedade é restrita ao valor de suas ações/quotas. A desconsideração da personalidade jurídica somente pode ocorrer em situações específicas.
Os tribunais do trabalho geralmente aplicam a teoria ampla da desconsideração da personalidade jurídica, adotada pelo Código de Defesa do Consumidor, que tem como fundamento a vulnerabilidade do credor. Sustentam que a mera ausência de patrimônio suficiente para fazer frente às obrigações trabalhistas é razão para desconsiderar a personalidade jurídica e perseguir bens de sócios (mesmo minoritários) e administradores.
Por outro lado, o Código Civil, de forma mais razoável, adota teoria mais restritiva da desconsideração da personalidade jurídica, que se fundamenta na prática de abuso da personalidade jurídica, ou seja, a utilização da sociedade por sócios e/ou administradores a fim de obter vantagens pessoais e prejudicar terceiros. Haverá abuso apenas nos casos de desvio de finalidade e de confusão patrimonial.
A Lei de Liberdade Econômica, recém promulgada, visa a simplificar atividades econômicas e prevê que sócios somente serão responsabilizados quando beneficiados, direta ou indiretamente, pelo abuso da personalidade jurídica. Tal dispositivo poderá proteger minoritários que não tenham poder de gerência. A lógica por trás da norma é a limitação da aplicação do instituto da desconsideração pelos tribunais. Ainda que tal lei não seja vinculativa no caso de relações de trabalho, ela pode vir a influenciar a jurisprudência, bem como futuras reformas nas leis trabalhistas.
Algumas decisões isoladas dos tribunais do trabalho parecem se basear em lógica semelhante. Em 2018, o Tribunal Regional do Trabalho do Rio de Janeiro decidiu que acionista minoritário sem poder de gestão não é pessoalmente responsável pelas obrigações trabalhistas de sociedade. A decisão adota a tese de que acionistas devem ser pessoalmente responsáveis quando beneficiados pelo abuso da personalidade jurídica. Ainda é cedo para prever, mas espera-se que as recentes mudanças legislativas tornem mais frequentes decisões semelhantes.
Várias leis em matéria trabalhista estão sendo discutidas no Congresso e uma nova reforma trabalhista também está sendo considerada. A tendência é proporcionar maior flexibilidade às regras trabalhistas e mais liberdade para empregado e empregador estabelecerem os termos e condições de sua relação, visando gerar menos obstáculos para as sociedades e mais empregos.
O mercado de trabalho brasileiro ainda sofre com entraves legislativos, e os juízes trabalhistas entendem que o risco da atividade econômica não pode ser compartilhado entre empregadores e empregados. No entanto, mudanças recentes em relação à aplicação da desconsideração da personalidade jurídica podem ser consideradas um passo em direção a interpretação mais moderna da lei, voltada aos interesses do mercado. Houve certa evolução em relação à exposição dos sócios às obrigações trabalhistas, e novos avanços podem ser esperados.