O Brasil não tem conseguido no seu percurso recente recursos significativos para sua infraestrutura, o que tem impedido o progresso que as riquezas do país justificariam.
Sendo os recursos internos insuficientes, a atração de capitais externos seria a solução de curto prazo. Só que essa atração segue a passo lentos, residindo a explicação, ao menos em parte, em fracassos recentes de país para o qual se prevê com frequência progresso que não se materializa.
Entretanto, há explicação mais específica para a dificuldade: a incerteza sobre o valor da moeda brasileira.
O risco macroeconômico de desvalorização da moeda que afasta o capital estrangeiro se materializa quando a moeda brasileira perde valor após investimento de risco ou empréstimo entrar no país. Processo que falseia o cálculo de risco/retorno dos doadores de capital. De fato, o projeto em que se investiu pode como resultado da desvalorização ser incapaz de gerar recursos suficientes para assegurar aos investidores o retorno esperado na venda dos investimentos, e pode mesmo colocar em risco a devolução integral do principal de financiamentos recebidos. Pior ainda, e mais preocupante, pode ser a diminuição de recursos disponíveis para pagamento de dividendos e juros, que afinal são devidos antes, havendo em relação a eles menos tempo para cobertura de eventualidades.
Há, por outro lado, mecanismos já estabelecidos que oferecem proteção (hedge) ao fluxo de recursos externos relacionados a projetos em curso.
A solução pode residir em técnicas alternativas que permitam ao menos a cobertura de obrigações com financiamentos. Em nível básico, a regulação cambial autoriza a abertura de contas em moeda estrangeira no país por sociedades que desenvolvam projetos relacionados com a produção, e transporte de petróleo e de gás natural, e com a geração e transmissão de energia elétrica. Permite-se assim proteção contra desvalorização cambial a partir do momento em que o projeto gera receita, a qual pode ser imediatamente convertida para moeda estrangeira.
Mas esse mecanismo tem o defeito de não oferecer proteção para receita futura. A solução para isso seria a existência de um patrocinador dos riscos do projeto, que modera a contingência de financiadores oferecendo a eles de forma direta ou indireta compensação em caso de desvalorização cambial. Alternativamente, se for consumidor dos produtos ou serviços do projeto, o patrocinador pode criar o mesmo efeito protetivo oferecendo comprar a produção do projeto por valor que corresponda ao montante em moeda estrangeira necessário para honrar os financiamentos, mais margem de lucro da sociedade titular do projeto. Esse tipo de formulação não sofreria a incidência de normas legais que impedem a dolarização da economia brasileira, por representar mera transferência de ônus cambial já existente.
Entretanto, para projetos de valor elevado pode ser difícil ou impossível encontrar financiadores com disposição ou perfil creditício para assumir o risco cambial. Aqui será necessária solução adaptada à lógica do financiamento de projetos, em que o próprio fluxo financeiro da atividade desenvolvida é usado no pagamento das obrigações, ou no hedge delas.
Esse objetivo pode ser obtido pelo estabelecimento de fundo para agrupar os recursos do projeto. Tais recursos podem derivar diretamente das receitas do empreendimento, uma parcela das quais seria direcionada a conta-reserva destinada a suplementar pagamentos de juros e principal de empréstimos, quando prejudicados por desvalorização da moeda local.
Alternativa ou adicionalmente, os recursos do fundo podem se originar dos próprios investidores ou financiadores do projeto, os quais direcionariam uma parcela dos recursos desembolsados para capitalizar a estrutura de proteção cambial.
Uma terceira opção, adequada a projetos que dirigem sua produção a rol limitado de consumidores finais de bens e serviços, seria a criação de adicional tarifário para a capitalização da estrutura protetiva.
Em todo caso, o mecanismo a ser criado funcionaria em caráter bilateral. Ou seja, na falta de desvalorização cambial, e não havendo portanto demanda para seus recursos, seriam revertidos para os provedores do capital do fundo, sejam eles financiadores, investidores, consumidores ou a própria sociedade responsável pelo projeto. No caso de os patrocinadores do fundo serem consumidores de sua produção, a devolução a eles pode se dar na forma de redução na contraprestação do que consomem.
Uma estrutura desse tipo foi implementada no Estado de São Paulo pela agência local de transportes (Agência de Transporte do Estado de São Paulo – ARTESP) de forma a proteger financiamentos de até US$ 500 milhões dirigidos à concessão rodoviária Piracibaba-Panorama. No caso, a proteção cambial é obtida através da capitalização de conta mantida por instituição financeira. Para ela são direcionados 4% das receitas do projeto, que podem ser usadas para compensar desvalorização cambial da moeda brasileira. Se, contrariamente, a moeda brasileira aumentar de valor, é o governo do Estado que recebe pagamento adicional, ao invés da sociedade concessionária.
Os fundos depositados na conta podem ser investidos no mercado financeiro ou de capitais, incluindo em modalidades que propiciem hedge em moeda estrangeira. E, se maior formalidade for conveniente para atrair investidores, o mecanismo de proteção pode assumir a forma de carteira administrada ou mesmo de fundo de investimento. Ambas as estruturas são reguladas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em aspectos como organização, administração e vedação de conflito de interesses.