A abertura à iniciativa privada de setores de infraestrutura submetidos a controle estatal traz consigo a questão do papel que a concorrência pode ter nesse processo. Não há necessária relação entre privatização e concorrência. É possível simplesmente transferir a particulares bens ou serviços explorados por entes estatais sem que se altere a estrutura de monopólio dos respectivos mercados. Nesse caso haverá apenas concorrência "pelo mercado" no processo de seleção do particular que assumirá a exploração dos bens ou receberá a concessão dos serviços. Nesse contexto, é especialmente importante regulação apta a acompanhar a atuação da empresa privada em atenção aos interesses dos usuários e ao interesse público.
Mas a privatização pode ser acompanhada de mudanças profundas na organização e estrutura dos mercados afetados, com o propósito de criar condições de concorrência entre agentes privados, sempre desejáveis por trazerem bons resultados como diminuição de preços e aumento de eficiências.
A geração de concorrência "no mercado" em setores de infraestrutura não é simples. Por vezes exigirá regulação concorrencial até mais complexa do que aquela voltada ao controle de um monopolista. Também poderá aumentar as incertezas, para os particulares, quanto ao retorno de seus investimentos em capital, os quais costumam ser significativos em projetos de infraestrutura.
No caso dos aeroportos essas dificuldades estão presentes. É complexa e frequentemente inviável a organização desses serviços em regime de concorrência. Parte significativa dos aeroportos de um país depende de subsídios para se viabilizar. Outros podem até ser rentáveis, mas apresentam características próprias de monopólios naturais, contexto em que a forma mais eficiente de explorar o serviço é por meio de apenas uma empresa. Nos casos em que for viável, a concorrência no âmbito dos serviços aeroportuários é concebível sob diversos formatos.
Pode envolver aeroportos com algum grau de proximidade geográfica que disputam o mesmo fluxo de vôos e passageiros. A distância na qual a concorrência se viabiliza depende do perfil da demanda atendida. Se esta é composta de passageiros que têm como destino determinada cidade, os aeroportos deverão estar próximos desta. Mas se for composta por passageiros internacionais ou em conexão, as distâncias podem ser muito maiores. A mera presença na mesma região de dois aeroportos também não implica que será factível estabelecer concorrência entre eles, pois, afinal, podem estar voltados e estruturados para atender de forma específica esses diferentes perfis de demanda.
Além da concorrência entre aeroportos, é possível cogitar também da concorrência dentro do mesmo aeroporto entre distintos terminais. Mas trata-se de modelo de implantação e gestão complexas. A administração de um aeroporto envolve a necessidade de coordenar diversos atores – alfândega, polícia, companhias aéreas, controle de tráfego, operadores de serviços secundários. A existência de terminais administrados por empresas distintas insere dificuldade adicional na organização de todo esse sistema. Exige, ainda, regras para disciplinar a relação entre os terminais e quem opera as pistas e controla o processo de pousos e decolagens, assim como a forma pela qual serão alocados entre os distintos terminais os espaços de pousos e decolagens.
O Brasil ainda não tem definido um modelo geral para concessão de seu sistema aeroportuário à iniciativa privada e qual papel a concorrência deverá desempenhar nesse contexto. Há apenas um processo em fase avançada – o aeroporto de São Gonçalo do Amarante no Rio Grande do Norte. Discute-se, ainda, o modelo a ser usado para outros aeroportos específicos – como Guarulhos, Viracopos e Brasília. Não há, além disso, clareza quanto a se o grau de interesse de investidores e gestores privados será suficiente para atrair os investimentos necessários, o que dependerá substancialmente da previsibilidade e da segurança de retorno oferecidos pelos modelos de concessão que forem estruturados. Trata-se de cenário no qual a concorrência terá, ao menos no primeiro momento, papel limitado ao processo de disputa “pelo mercado”.