Decisão em consulta recentemente divulgada pela Receita Federal do Brasil sobre a tributação de receitas de corretagem recebidas de não-residentes causou surpresa no mercado financeiro.
Embora só vincule o consulente, a consulta manifestou-se no sentido de que as contribuições para o Programa de Integração Social (PIS) e para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS) incidiriam sobre as corretagens e comissões recebidas por corretoras brasileiras de seus clientes no exterior. Isso provocou insegurança, sobretudo em face da justificativa apresentada como fundamento da decisão.
As normas disciplinadoras da matéria (artigo 14, inciso III da Medida Provisória nº 2,158-35, de 28 de agosto de 2001 e art. 5º da Lei 10.637, de 30 de dezembro de 2002) estabelecem que referidas contribuições não incidem sobre a prestação de serviços para pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no exterior cujo pagamento represente ingresso de divisas.
Todavia, a Receita Federal concluiu que essa isenção não seria aplicável no caso de corretagens pagas por residentes ou domiciliados no exterior que tenham feito investimentos no país de acordo com a Resolução nº 2.689, de 26 de janeiro de 2.000, do Conselho Monetário Nacional, por não se verificar, nessa hipótese, o ingresso de divisas no país.
Para embasar a decisão, as autoridades fiscais alegam que os valores remetidos a esse título para o Brasil destinam-se à realização de investimentos, e não ao pagamento pela prestação de serviços de corretagem, que por ser quitada com os ganhos decorrentes de aplicações financeiras aqui contratadas, não representaria ingresso de divisas.
Essa decisão peca por partir de premissas equivocadas, fruto da provável falta de familiaridade das autoridades fiscais com as práticas adotadas no mercado financeiro e de capitais.
As corretagens em questão são exigidas não apenas na venda dos ativos adquiridos no Brasil e consequente retorno do capital investido, mas também na aquisição de títulos e valores mobiliários com os recursos ingressados no país.
Em outras palavras, ao fazer uma aplicação no mercado na forma da referida Resolução, o investidor contrata uma instituição brasileira autorizada a operar pelo Banco Central do Brasil, dá a ordem de compra e autoriza a utilização de parte dos recursos ingressados no país para pagamento dos serviços de corretagem que lhe são prestados na aquisição dos bens. Nesse caso específico, é irrefutável que a corretagem paga representa um efetivo ingresso de divisas por ser liquidada com parcela do valor destinado ao investimento, razão pela qual prevalece a isenção tributária.
Caso o investidor estrangeiro apure perda na aplicação feita, e queira retornar os recursos remanescentes ao país de origem, incorrerá também em custos de corretagem por ocasião da venda dos papéis negociados.
Nessa situação também não haverá qualquer dúvida de que a corretagem será necessariamente paga com recursos que representam efetivo ingresso de divisas no país, pois ao contrário do que pressupõe a decisão de consulta, o investidor não auferiu qualquer lucro para quitar a obrigação de pagamento da corretagem.
Esses dois exemplos, por si sós, demonstram a impropriedade da premissa adotada pela fiscalização para decidir sobre o assunto, que sequer vislumbrou essas possibilidades.
Dando um passo adiante, tampouco pode ser prejudicado com o obstáculo à isenção o investidor estrangeiro que registre resultado positivo em suas aplicações no Brasil e, ato contínuo, promover o retorno de seus recursos ao país de origem, autorizando o desconto do valor da corretagem dos valores retornados.
Isso porque os recursos relacionados aos investimentos feitos na forma da Resolução 2.689/00 encontram-se permanentemente à disposição do investidor estrangeiro, inclusive para remessa ao exterior. A permanência definitiva no Brasil, para pagamento das corretagens, de parte dos recursos (que, repita-se, do contrário seriam remetidos ao exterior) corresponde a um efetivo ingresso de divisas.
É claro que não faria sentido o investidor remeter os recursos ao exterior para imediatamente remetê-los novamente ao Brasil para pagamento da corretagem. Além da burocracia exigida, as corretoras teriam que assumir o risco de crédito decorrente do eventual inadimplemento, resultando em aumento de custos. A permanência dos recursos usados para pagamento da corretagem no Brasil, que de outra forma seriam restituídos ao investidor estrangeiro, atende a finalidade das leis que contemplaram a hipótese de isenção, que é o de incentivar o fortalecimento das divisas do país através da exportação de serviços.
Por fim, a decisão em questão é também conflitante com outras proferidas em situações análogas, segundo as quais a intermediação de agente ou representante no Brasil de empresa estrangeira tomadora dos serviços, por si só, é insuficiente para descaracterizar a isenção, desde que a terceira pessoa atue na condição de mero mandatário, agindo em nome e por conta do mandante pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no exterior.
É exatamente isso que ocorre no caso de investimentos no mercado financeiro, cuja legislação exige a participação de um representante legal que age por conta e ordem do investidor estrangeiro, na condição de mandatário.
É, portanto, descabida a imposição de qualquer óbice à isenção do PIS e COFINS sobre a prestação de serviços de corretagem a investidor estrangeiro que aplique seus recursos no país observando os termos da Resolução nº 2.689/00.