O Cade e o mercado de energia elétrica

A definição do mercado relevante constitui passo fundamental da análise concorrencial, na medida em que permite identificar as relações de concorrência de que participa determinado agente econômico e eventuais efeitos de uma operação ou conduta sobre as estruturas do mercado e demais agentes.  Nas operações do setor de energia, porém, a definição do mercado ainda é objeto de divergência por parte das autoridades.

Até 2007, o mercado de geração de energia era visto pelas autoridades de defesa da concorrência como sendo único e de âmbito nacional, englobando as diferentes matrizes energéticas − hídrica, térmica, eólica e nuclear.  No entanto, a partir desse ano, a Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae) do Ministério da Fazenda passou a adotar definição mais restritiva, segregando diferentes mercados em função das diferentes matrizes.  Esse entendimento baseia-se na percepção de que variam os volumes de investimentos e prazos para entrada em operação de cada tipo de unidade geradora. 

O critério adotado, contudo, não reflete de maneira adequada a realidade do novo modelo do setor elétrico, instituído pelas Leis  nº 10.847 e nº 10.848, de 2004, e pensado para viabilizar a diversificação da matriz energética brasileira, até então excessivamente dependente da energia hidrelétrica.

A política de diversificação possibilitou a integração das fontes hídricas e térmicas em estrutura única de geração de energia, apesar das diferenças de custos e processos produtivos.  O objetivo era garantir a possibilidade de substituição entre as matrizes energéticas, assegurando a confiabilidade do suprimento em todas as regiões.

A existência de um único mercado relevante também decorre do Ambiente de Contratação Regulada, no qual a comercialização da energia é feita por meio de leilões promovidos pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica.  Os leilões limitam o poder de decisão dos agentes sobre condições de oferta e restringem a possibilidade de escolha de distribuidoras e consumidores finais, na medida em que todos os geradores vendem energia para todas as distribuidoras, independentemente da matriz elétrica.

Por fim, a unicidade do mercado é ainda garantida pela centralização das decisões relativas à geração de energia no Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), que busca obter o melhor aproveitamento dos recursos existentes.  Com base em informações sobre os níveis dos reservatórios, as tendências hidrológicas e os custos de geração e de comercialização das termelétricas, o ONS define quais usinas atenderão a demanda em dado momento.

Como se vê, as autoridades regulatórias tiveram cuidado especial com o planejamento e implantação do novo modelo do setor elétrico, cujos objetivos incluem a integração de todo o sistema de geração de energia brasileiro, não obstante as diferenças em custos e processos produtivos.  Justamente por isso, a opção de segregar mercados relevantes em função do tipo de unidade geradora não tem sido adotada em todos os casos julgados pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica. 

A análise da jurisprudência recente do Cade demonstra que a questão, embora muito importante, ainda está longe de ser pacífica.  Em operações analisadas nos últimos quatro anos, o Cade adotou expressamente a definição unificada do mercado relevante em 10 atos de concentração.  A definição mais restritiva, segregando as matrizes energéticas, foi adotada em 13 outros atos julgados nesse mesmo período.

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Autores L&S

Alexandre Ditzel Faraco

Alexandre Ditzel Faraco

Sócio

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