MP nº 627/13: novas regras de tributação dos lucros no exterior
Motivada pela decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2588 e nos entendimentos mantidos com grandes contribuintes, a Medida Provisória (MP) nº 627, de 11 de novembro de 2013, introduziu profundas mudanças nas normas que dispõem sobre a tributação dos lucros auferidos no exterior por controladas ou coligadas de pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil. Em linhas gerais, as alterações aproximam a tributação brasileira às chamadas normas "CFC" (Controlled Foreign Corporations) praticadas por outros países e recomendadas pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Dentre as principais mudanças, destaca-se a permissão para que a controladora brasileira recolha o Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) tendo como base os lucros auferidos no exterior por controlada1 , direta ou indireta, relativos ao ano calendário em que forem apurados, na proporção em que os resultados forem distribuídos nos cinco anos subsequentes2.
Nessa hipótese, foram fixados entretanto limites e condições: (i) no mínimo 25% do resultado apurado será considerado automaticamente distribuído no primeiro ano subsequente ao período de apuração e (ii) no quinto ano subsequente ao período de apuração, o valor restante não distribuído deve ser oferecido à tributação. Para aderir a essa modalidade de pagamento, o contribuinte deve ainda informar o valor em declaração que represente confissão de dívida e formalizar desistência de eventuais processos nos quais discuta a matéria, renunciando ao direito sobre o qual se fundamentam.
O pagamento nessas condições pode ser realizado somente em relação à parcela do lucro auferido por controlada que (i) não esteja localizada em jurisdição com tributação favorecida (paraíso fiscal) nem se beneficie de regime fiscal privilegiado; (ii) não esteja sujeita a regime que tribute os lucros de pessoa jurídica domiciliada no exterior a alíquota nominal inferior a 20% (subtributação); (iii) não seja controlada, direta ou indiretamente, por pessoa jurídica submetida aos mencionados tratamentos tributários, e (iv) tenha renda ativa própria igual ou superior a 80% da sua renda total.
É permitida a compensação dos prejuízos acumulados pela controlada domiciliada no exterior, referentes a anos anteriores à vigência da MP, com lucros futuros da própria controlada, sem limite de prazo.
Não será computada para cálculo do IRPJ e da CSLL a parcela do lucro auferido no exterior por controlada direta dedicada ao afretamento por tempo ou prestação de serviços relacionados à prospecção e exploração de petróleo e gás em território brasileiro, desde que contratada por pessoa jurídica detentora de concessão ou autorização para desempenhar atividades de exploração, desenvolvimento e produção de petróleo e gás natural.
As parcelas dos lucros auferidos no exterior decorrentes de renda ativa própria poderão ser consideradas de forma consolidada até o ano calendário de 2017, desde que as investidas (i) não se encontrem em país sem acordo com o Brasil para troca de informações tributárias; (ii) não estejam em paraísos fiscais nem se sujeitem a regime fiscal privilegiado ou regime de subtributação; e (iii) não sejam controladas, direta ou indiretamente, por pessoa jurídica submetida ao tratamento tributário descrito no item "ii". O benefício da consolidação é permitir a soma algébrica dos resultados de várias controladas diferentes, com diminuição do lucro de umas pelo prejuízo de outras. A empresa deve avaliar em quais casos a consolidação é vantajosa.
No caso de resultado negativo, a controladora domiciliada no Brasil deverá informar ao Fisco as parcelas negativas consideradas na consolidação, no momento da apuração. O saldo remanescente de prejuízo acumulado de cada pessoa jurídica poderá ser utilizado na compensação com lucros futuros da mesma entidade estrangeira que lhes deu origem, até o quinto ano-calendário subsequente. Esse prazo só será computado após o início das operações da empresa no exterior.
Quando não houver consolidação, seja por opção do contribuinte ou por impedimento legal, a parcela do ajuste do valor do investimento na controlada equivalente aos lucros ou prejuízos por ela auferidos deverá ser considerada de forma individualizada na apuração do IRPJ e CSLL devidos pela controladora brasileira. O resultado positivo deve ser adicionado ao lucro líquido relativo ao balanço de 31 de dezembro do ano-calendário em que os lucros forem apurados pela empresa estrangeira. O resultado negativo poderá ser compensado com lucros futuros da mesma pessoa jurídica no exterior que lhes deu origem, até o quinto ano-calendário subsequente.Já os lucros auferidos por coligadas no exterior serão tributados pelo IRPJ e CSLL no Brasil apenas quando disponibilizados à pessoa jurídica domiciliada no Brasil, desde que a investida cumpra, cumulativamente, as seguintes condições:
1. não esteja sujeita a regime que tribute os lucros de pessoa jurídica domiciliada no exterior a alíquota nominal inferior a 20% (regime de subtributação);
2. não esteja localizada em paraíso fiscal ou submetida a regime fiscal privilegiado;
3. não seja controlada, direta ou indiretamente, por pessoa jurídica sujeita ao tratamento fiscal previsto no item 2 acima; e
4. aufira renda ativa própria igual ou superior a 80% da sua renda total.
Para tal fim, os lucros serão considerados disponibilizados à empresa no Brasil: (i) na data do pagamento ou crédito em conta representativa de obrigação da empresa no exterior; (ii) no caso de contratação de mútuo, se a coligada mutuante possuir lucros ou reservas de lucros; ou (iii) no caso de adiantamento de recursos pela coligada por conta de venda futura cuja liquidação, pela remessa do bem ou serviço vendido, ocorra em prazo superior ao ciclo de produção do bem ou serviço.
Não sendo atendidos os requisitos supracitados, a parcela do ajuste do valor do investimento na coligada equivalente aos lucros ou prejuízos por ela apurados deverá ser computada na apuração do IRPJ e da CSLL devidos pela investidora domiciliada no Brasil. O resultado positivo deve ser adicionado ao lucro líquido em 31 de dezembro do ano-calendário em que os lucros forem apurados pela coligada, podendo o resultado negativo ser compensado com lucros futuros da mesma coligada no exterior que lhes deu origem, até o quinto ano-calendário subsequente.
A MP nº 627/13 permite ainda algumas deduções na apuração do IRPJ e CSLL devidos pela entidade brasileira. Algumas são deduções das bases de cálculo, ao passo que outras são deduções do próprio IRPJ e CSLL devidos no Brasil. Por exemplo, podem ser deduzidos do próprio valor do IRPJ e da CSLL devidos: (i) o imposto de renda (IR) pago pela controlada no exterior sobre as parcelas positivas oferecidas à tributação no Brasil, inclusive o imposto retido na fonte sobre o lucro distribuído para a investidora brasileira, até o limite do imposto de renda incidente no Brasil sobre tais parcelas, podendo eventual excesso não aproveitado ser abatido da CSLL, e (ii) o IR retido na fonte no exterior sobre dividendos de coligadas tributados pelo IRPJ e CSLL no Brasil, em determinadas situações e observados certos limites.
Relativamente às pessoas físicas, os lucros decorrentes de participações em sociedades controladas domiciliadas no exterior serão considerados disponibilizados na data do balanço no qual tiverem sido apurados e estarão sujeitos à tributação do IR no Brasil caso (i) a controlada esteja localizada paraíso fiscal, se beneficie de regime fiscal privilegiado ou de regime de subtributação, ou (ii) a pessoa física residente no Brasil não possua os documentos de constituição da entidade estrangeira e suas alterações, registrados em órgãos competentes e de domínio público, que identifiquem os demais sócios.
À mesma tributação se sujeitam as pessoas físicas residentes no Brasil que, em conjunto com outras pessoas consideradas vinculadas nos termos da MP nº 627/13, detenham participação superior a 50% do capital votante da pessoa jurídica controlada domiciliada no exterior.
1 Para fins do disposto na MP nº 627/13, equipara-se à condição de controladora a pessoa jurídica domiciliada no Brasil que detenha participação em coligada no exterior e que, em conjunto com pessoas a ela vinculadas, possua mais de 50% do capital votante da coligada no exterior.
2 Essa mesma permissão foi estendida ao resultado de filial ou sucursal no exterior (exceto filiais ou sucursais de controladas de empresa brasileira que estejam situadas no mesmo país de sua matriz, hipótese em que os resultados de matriz e filiais/sucursais deverão ser consolidados e entendidos como de uma única pessoa jurídica).