A interpretação da Receita Federal do Brasil à Lei nº 13.254, de 13 de janeiro de 2016, que instituiu o Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (RERCT), tem trazido intranquilidade aos contribuintes, reduzindo as adesões ao programa e frustrando as expectativas da administração pública em relação à receita esperada.
A polêmica teve início com a divulgação do “Perguntas e Respostas” elaborado pela Subsecretaria de Fiscalização e Subsecretaria de Tributação e Contencioso da Secretaria da Receita, segundo a qual “Quem desejar estender integralmente os efeitos da lei aos bens e às condutas a eles relacionadas, deverá informar tanto a parte do bem remanescente em 31/12/2014 como a parte consumida.”
Ainda de acordo com a nota acrescida à questão nº 39 do “Perguntas e Respostas”, a inclusão no RERCT de recursos não mais existentes em 31 de dezembro de 2014 estaria prevista no inciso V do § 1º do art. 4º da Lei nº 13.254/16, e sua inclusão estenderia os efeitos da adesão às condutas diretamente relacionadas a esses bens e direitos.
A posição das autoridades fiscais tem provocado intensa controvérsia no meio jurídico, não apenas em razão da maneira como aquela disposição legal vem sendo interpretada, mas também porque em muitas situações mostra-se absolutamente inexequível sob o ponto de vista prático.
Tome-se como exemplo o contribuinte que no período de 2000 a 2006 – ou seja, há mais de 10 anos - tenha consumido a totalidade dos recursos que se encontravam em conta no exterior.
Nesse caso, aquele que não tenha mantido os comprovantes de movimentação bancária do período estará obrigado a requerer uma cópia destes à instituição financeira no exterior, que por sua vez, poderá já não tê-los mais em arquivo.
Como faria então o aderente que se encontre nessa situação para regularizar sua posição junto ao fisco e ao Banco Central? Estará ele impedido de aderir, continuando sujeito inclusive à pena de restrição à liberdade, por conta de um problema insolúvel, mesmo tendo interesse em regularizar sua situação?
Considerando que grande parte dos casos diz respeito a saldos em contas correntes ou de investimento em que há movimentação financeira anterior a 31 de dezembro de 2014, a tendência natural é de que o nível de adesões ao RERCT continue baixo em razão da insegurança jurídica provocada pela interpretação conferida pela Secretaria da Receita à norma e da dificuldade do contribuinte na obtenção de dados, sobretudo se levados em consideração os prazos de prescrição previstos na lei penal, que podem chegar a 16 anos, dependendo do ilícito cometido.
Considerando que esse impasse não interessa nem à Administração Tributária - que pretendia elevar substancialmente a arrecadação para fazer frente às sucessivas quedas - nem ao contribuinte - que visa eximir-se da sujeição às penalidades de natureza tributária e penal, convém aguardar a evolução dessa questão até a proximidade do prazo para adesão ao RERCT, que se esgota em 31 de outubro deste ano.
Nesse meio tempo, o contribuinte deve pedir às instituições no exterior os extratos de suas contas, para então decidir sobre a inclusão dos valores eventualmente obtidos na base de cálculo do tributo e da multa exigidos.