Ilegalidade das leis que restringem a dedutibilidade de despesas com veículos
A legislação tributária brasileira se vale, com certa frequência, de termos e expressões de natureza subjetiva, dificultando sua interpretação e provocando insegurança jurídica. É o que ocorre no caso do artigo 13 da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995, que autoriza a dedução, da base de cálculo do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), de despesas com bens móveis e imóveis, desde que intrinsecamente relacionadas à atividade exercida pelo contribuinte.
No que se refere a veículos, a interpretação conferida pela administração tributária ao termo "intrinsecamente" levou-a a conceituar como dedutíveis apenas os gastos com a manutenção, depreciação, locação e arrendamento daqueles diretamente relacionados à produção de bens ou serviços, tais como caminhões e utilitários (art. 25 da Instrução Normativa nº 11, de 21 de fevereiro de 1996, do secretário da Receita Federal).
Essa interpretação restritiva do fisco afronta o princípio da tipicidade cerrada em matéria tributária e retira a liquidez e certeza do lançamento.
As normas que dispõem sobre dedutibilidade de despesas, gastos e encargos não podem ser interpretadas com base em razões de mera conveniência da administração. O termo "intrínseco" utilizado pelo legislador não pode ser interpretado de forma dissociada da norma geral que regula a dedutibilidade de despesas, inserida no art. 47 da Lei nº 4.505, de 30 de novembro de 1964 e reproduzida no art. 299 do atual Regulamento do Imposto de Renda. Essa norma considera como dedutíveis as despesas normais ou usuais no tipo de transações, operações ou atividades empresariais.
O termo "intrínseco" deve ser entendido como indicativo do conjunto de gastos que tenham relação de pertinência com as atividades da sociedade, aí incluídos aqueles que apesar de não serem imprescindíveis ao seu funcionamento, contribuam para o ganho de eficiência. Isso significa que o atendimento ao requisito da necessidade deve ser aferido com razoabilidade pela fiscalização.
Um bom exemplo de despesa necessária é a lavanderia que poderia perfeitamente exercer suas operações mediante trabalho braçal, mas optou pela utilização de máquinas para lavar e passar tecidos, de forma a alcançar ganhos de escala e produtividade. Embora possa ser considerada teoricamente prescindível, é inegável que a despesa com a depreciação dessas máquinas é necessária, e como tal, dedutível na apuração do lucro tributável.
No que respeita especificamente a veículos, reiteradas decisões do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) assentam o entendimento de que a cláusula aberta prevista no art. 13 da Lei nº 9.249/95 não pode ser interpretada de forma a restringir o direito à dedutibilidade das despesas incorridas com essa espécie de bens, pois o fisco não é competente para definir o meio de transporte mais adequado para o contribuinte.