Mesmo antes de pedir recuperação judicial, em junho de 2019, a Odebrecht já tinha começado a vender ativos para fazer caixa e tentar sobreviver à Operação Lava Jato e suas consequências. Mas quais são os riscos que potenciais investidores devem considerar ao avaliar investimentos em empresas envolvidas em casos de corrupção no Brasil?
A Lei Anticorrupção prevê que “[n]as hipóteses de fusão e incorporação, a responsabilidade da sucessora será restrita à obrigação de pagamento de multa e reparação integral do dano causado, até o limite do patrimônio transferido (...)”. Outras sanções, como proibição de contratar com a Administração Pública, não podem ser impostas à empresa resultante ou ao investidor.
A impressão inicial é a de que essa proteção legal assegura previsibilidade e limita a responsabilidade que pode advir do investimento feito. O problema é que a Lei Anticorrupção é apenas uma dentre várias normas que conferem a diversas autoridades poder para impor sanções a empresas envolvidas em corrupção. A Lei de Improbidade Administrativa, a Lei de Licitações e Contratos Administrativos, a Lei Orgânica do TCU e a Lei de Defesa da Concorrência não têm dispositivos semelhantes.
Assim, a aquisição de ativos de, ou a fusão com, empresas envolvidas em ilícitos implica risco de responsabilização da entidade resultante ou do investidor por valores elevados de multas e indenizações, além de outras sanções.
Duas circunstâncias, contudo, podem mitigar esse risco: (i) se a empresa-alvo já tiver celebrado acordos de leniência, termos de ajustamento de conduta ou compromisso de cessação com as autoridades capazes de impor as sanções mais graves; e (ii) se os ativos forem adquiridos no âmbito de uma recuperação judicial.
De fato, a Lei da Recuperação Judicial prevê que o plano de recuperação pode contemplar a venda de ativos ou a segregação de negócios do devedor. Se essa alienação ocorrer via leilão judicial, o comprador não sucederá o vendedor nas obrigações e responsabilidades decorrentes de fatos anteriores.
Já quanto à compra de ativos de empresas que já celebraram acordos com autoridades, a experiência mostra que as que optaram por soluções negociadas com a Controladoria-Geral da União, a Advocacia-Geral da União, o Ministério Público Federal e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica têm conseguido reduzir ou eliminar sua exposição a sanções ou pleitos indenizatórios adicionais de outras autoridades.
A rigor, não há garantia de que essas outras autoridades deixarão de impor mais sanções no futuro, mas há um forte argumento de boa-fé no sentido de que não cabe a aplicação de sanções adicionais.
Assim, a decisão dos investidores deve se basear em uma análise cuidadosa dos acordos já celebrados pela empresa investigada e da sua exposição a pleitos indenizatórios que ainda possam ser formulados e sanções que ainda possam ser impostas.