No Brasil, cartéis são combatidos em três frentes principais: a) administrativa, com a imposição de multas pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e outros órgãos da Administração Pública; b) penal, com possível denúncia criminal contra as pessoas físicas envolvidas; e c) cível, com possíveis ações de indenização pelos danos causados por cartéis (ARDCs).
Para estimular a terceira frente de repressão, o Cade editou, no dia 11 de setembro de 2018, a Resolução nº 21/18, que regula o acesso por terceiros, especialmente vítimas de cartel, aos Processos Administrativos para Imposição de Sanções Administrativas por Infrações à Ordem Econômica. O desafio na elaboração da norma era estimular o ajuizamento de ARDCs, mas manter os incentivos à celebração dos acordos de leniência e termos de compromisso de cessação (TCCs). Tais acordos são muito importantes para as duas primeiras frentes de combate, mas não protegem seus signatários de ARDCs.
Para fazer essa conciliação de objetivos, a Resolução estabelece que a regra é a publicidade dos processos, mas cria exceções. Prevê a manutenção do sigilo, por exemplo, de históricos de conduta e provas de teor autoacusatório fornecidos voluntariamente por quem decide celebrar acordos de leniência ou TCCs. As potenciais vítimas terão acesso à decisão condenatória, às informações obtidas por outros meios que não a colaboração e, ainda durante a investigação, ao rol de representados, à enunciação das condutas ilícitas imputadas ao representados e ao resumo dos fatos a serem apurados, além da indicação do preceito legal relacionado à suposta infração. Não terão, contudo, acesso ao que cada parte voluntariamente forneceu ao Cade como prova contra si mesma.
A norma também explicita que as exceções à publicidade serão mantidas mesmo após decisão final do Plenário do Tribunal do Cade. Essa previsão é relevante, pois o prazo prescricional das ARDCs no Brasil pode ainda não ter sido atingido quando dessa decisão final e há, ainda, risco de utilização dessas provas em outras jurisdições.
Nos termos da norma, os documentos cobertos pelas exceções à publicidade somente serão divulgados se houver concordância dos signatários do acordo que viabilizou a sua obtenção pelo Cade ou expressa determinação legal ou judicial. Trata-se de importante garantia aos signatários de acordos, que cumpre o objetivo de manter os incentivos à sua celebração.
A Resolução também impõe uma obrigação a quem negocia ou celebra acordos de leniência ou TCC: informar ao Cade “a existência de quaisquer medidas judiciais ou extrajudiciais [...], no Brasil ou no exterior, que versem sobre acesso a documentos e informações oriundos do mesmo Acordo de Leniência e/ou TCC”. Essa determinação tem por objetivo viabilizar a defesa do sigilo pelo Cade quando ela se der no interesse da investigação ou da defesa institucional da credibilidade do sigilo oferecido pela autoridade quando negocia tais acordos.
Por fim, a Resolução estabelece a possibilidade de se considerar o ressarcimento de danos às vítimas como uma atenuante na fixação de multas ou contribuições pecuniárias em acordos.