Boletim Tributário - Fevereiro 2017
I. Alterações legislativas e normativas
I.1 Medida provisória implementa novo “Refis”
Por meio da Medida Provisória (MP) nº 766, de 5 de janeiro de 2017, foi instituído o Programa de Regularização Tributária (PRT), cujo escopo é o parcelamento de dívidas tributárias e não tributárias federais, vencidas até 30 de novembro de 2016, inscritas ou não em dívida ativa.
Apesar de possibilitar parcelamento do débito em até 120 prestações, a utilização de prejuízos fiscais de IRPJ, base de cálculo negativa da CSLL ou créditos tributários acumulados administrados pela Receita Federal, o programa não prevê remissões e impõe uma série de critérios e restrições para que o benefício do parcelamento seja concedido, o que reduz a atratividade do programa.
Também contribuem para tornar o PRT pouco atrativo a necessidade de integral conversão de eventual depósito efetuado pelo contribuinte em renda da União; a vedação de migração do PRT a outro programa mais benéfico que sobrevenha; e a manutenção da cobrança de honorários de sucumbência nos casos de desistência ou renúncia de ações judiciais.
Por essas razões, o PRT é opção recomendável apenas para os contribuintes que tenham discussão administrativa ou judicial cuja perda esteja classificada como provável.
Para mais informações, veja nosso boletim “O Programa de Regularização Tributária – PRT”.
I.2 Lei modifica a legislação do ISS e inclui incidência sobre streaming
A Lei Complementar (LC) nº 157, publicada em 30 de dezembro de 2016, alterou o texto da LC nº 116, de 31 de julho de 2003, modificando a legislação do ISS, e da Lei nº 8.129, de 11 de novembro de 1992 (Lei de Improbidade Administrativa), impondo aos gestores públicos novas hipóteses de condenação por improbidade.
As principais mudanças consistem na inclusão das atividades de plataformas de armazenamento em nuvem (item 1.03 - atividades de processamento, armazenamento ou hospedagem de dados), elaboração de aplicativos (item 1.04 - elaboração de programas de computadores, inclusive jogos eletrônicos e programas para tablets e smartphones) e streaming (item 1.09 - disponibilização, sem cessão definitiva, de conteúdos de áudio, vídeo, imagem e texto por meio da internet) na lista de serviços anexa à LC nº 116/03.
A LC nº 157/16 pretende encerrar a guerra fiscal entre munícipios ao estabelecer que a alíquota nominal mínima de 2% para o ISS não pode ser reduzida por eventual concessão de qualquer benefício, direto ou indireto (o que levaria a alíquota efetiva a patamar inferior a 2%), sob pena de condenação do prefeito por improbidade administrativa.
Os municípios só poderão cobrar ISS sobre as atividades incluídas na lista anexa da LC nº 116/03 depois de editarem leis municipais e a cobrança está também sujeita às regras da anterioridade anual e nonagesimal. Portanto, o ISS só poderá ser cobrado a partir de 1º de janeiro de 2018, e desde que editadas leis locais até 30 de setembro de 2017.
Para mais informações, veja nosso boletim “Incidência de ISS sobre streaming pode ser questionada”.
II. Decisões administrativas
II.1 Carf dispensa PIS e Cofins sobre incentivo fiscal
Recente decisão da 3ª Turma da Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) dispensou contribuinte de pagar PIS e Cofins sobre crédito presumido de ICMS concedido pelo Estado de Santa Catarina.
Prevaleceu entendimento de que o crédito presumido concedido corresponde a mera recuperação de custos, tendo sido acrescentado que os créditos exigem contraprestação dos contribuintes para a efetiva constituição; assim, devem ser vistos como ingressos condicionados, não como receita.
Apesar de ainda não haver definição pelo Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o tema, a decisão da Câmara Superior, dada em julgamento de Recurso Especial de Divergência, consolida o entendimento do Carf e o alinha ao atual entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), onde há precedentes favoráveis aos contribuintes.
II.2 Crédito de PIS e Cofins sobre gastos com frete entre estabelecimentos próprios
Outra importante decisão também veio da 3ª Turma da Câmara Superior do Carf, em julgamento de Recurso Especial de Divergência, na qual se reconheceu que os gastos com frete no transporte de produtos acabados entre estabelecimentos do mesmo contribuinte geram créditos de PIS e Cofins.
De acordo com o voto vencedor da conselheira Érika Autran, a definição de insumos para fins de creditamento de PIS e Cofins deve ter em conta a essencialidade deles na prestação final de serviços ou na produção de bens destinados à venda. A conselheira considerou que os gastos com frete entre os estabelecimentos do contribuinte eram essenciais para o desenvolvimento de sua atividade final e, portanto, tais despesas deveriam gerar créditos de PIS e Cofins.
É precedente importante para os contribuintes, pois contraria o posicionamento até então firmado no Carf e no STJ, segundo o qual o creditamento de PIS e Cofins sobre frete apenas seria possível quando o transporte estiver relacionado a operações de venda de mercadorias e desde que o frete seja custeado pelo vendedor.
O conceito de insumos para fins de creditamento de PIS e Cofins é objeto de diversas controvérsias entre Fisco e contribuintes. Pende de julgamento pelo STJ o “leading case” que deverá pôr fim à discussão. O posicionamento da 3ª Turma reforça positivamente a tese dos contribuintes, especialmente daqueles que possuem centro de distribuição e se utilizam do frete interno como elemento essencial de suas operações.
II.3 Concessionárias têm prazo mínimo de 60 meses para amortizar ágio
No último dia 20 de janeiro, a Câmara Superior do Carf decidiu que o prazo mínimo de 60 meses para amortização do ágio gerado em operações de incorporação, fusão ou cisão também se aplica às concessionárias de serviços públicos.
Na visão da Fazenda, o ágio só poderia ser amortizado durante o período de vigência da concessão, conforme a Instrução CVM nº 247, de 27 de março de 1996. Mas, segundo o relator, conselheiro André Mendes de Moura, a Lei nº 9.532, de 10 de dezembro de 1997, não prevê prazo máximo para amortização, ao contrário do que defende a Receita.
Assim, está mantido o posicionamento anterior do Carf que, em 2011, afastou a limitação imposta pela Comissão de Valores MobCVM por entender tratar-se de ofensa ao princípio da legalidade em matéria tributária.
II.4 Incidência de IRRF na remessa ao exterior para periódicos eletrônicos
A Coordenação-Geral de Tributação (Cosit) da Receita Federal, por meio da Solução de Consulta (SC) Cosit nº 7, de 13 de janeiro de 2017, definiu que incide Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) à alíquota de 25% sobre as remessas ao exterior oriundas do Brasil para assinatura eletrônica de periódico estrangeiro, disponibilizado pela internet, seja por meio de download, e-mail ou página da web.
A SC nº 7, que tem efeito vinculante no âmbito da Receita, complementa a SC Cosit nº 125, de 28 de maio de 2014, segundo a qual não incide IRRF sobre as remessas destinadas ao exterior para pagamento por assinatura de periódicos impressos. Segundo a Cosit, a incidência de IRRF se justificaria para os periódicos eletrônicos, pois a disponibilização de conteúdo na internet seria prestação de serviços, conforme a Nomenclatura Brasileira de Serviços (NBS).
Contudo, a NBS não é fundamento juridicamente válido para justificar a incidência tributária e, apesar da recente inclusão do item 1.09 (disponibilização, sem cessão definitiva, de conteúdos de áudio, vídeo, imagem e texto por meio da internet, respeitada a imunidade de livros, jornais e periódicos) na lista de serviços anexa à Lei Complementar (LC) nº 116, de 31 de julho de 2003, não é possível caracterizar a disponibilização de periódicos eletrônicos como um serviço.
II.5 Uniformizada posição sobre isenção de PIS e Cofins para exportação de serviços
Por meio da Solução de Divergência (SD) nº 1, de 13 de janeiro de 2017, a Cosit reconheceu que a isenção de PIS e Cofins sobre receitas decorrentes da exportação de serviços obedece a regras distintas conforme a pessoa jurídica nacional receba o pagamento por tais exportações no exterior ou no Brasil, e que, no último caso, o requisito do “ingresso de divisas” deve ser interpretado de acordo com as regras da legislação monetária e cambial.
Como tais regras são relativamente flexíveis, nem sempre será necessária a existência de efetiva operação de conversão de moedas diretamente atrelada à realização do pagamento pela exportação dos serviços, sendo suficiente qualquer modalidade de pagamento autorizada pela legislação monetária e cambial que pressuponha a conversão de moedas internacionais em momento anterior, concomitante ou mesmo posterior à operação de pagamento pela exportação, ainda que em valores líquidos, o que acaba por ampliar a definição possível do “ingresso de divisas”.
O caso que motivou o posicionamento da Cosit envolvia uma corretora de resseguros brasileira que recolhia, por conta e ordem da resseguradora estrangeira, os prêmios de resseguro pagos por seguradoras nacionais e deduzia desses valores sua comissão, remetendo ao exterior os valores dos prêmios líquidos, o que é permitido pela legislação cambial. Segundo a Cosit, por este motivo, estaria caracterizado o “ingresso de divisas”, apesar de a efetiva “troca” de moedas ser realizada apenas para remessa dos prêmios já deduzidos da comissão que fora retida pela corretora brasileira.
Assim como as soluções de consulta, soluções de divergência da Cosit têm efeito vinculante no âmbito da Receita e, embora a SD nº 1 trate de caso específico das resseguradoras brasileiras, os fundamentos para a admissão de diversas formas de “ingresso de divisas”, desde que autorizadas pela legislação monetária e cambial, ultrapassam o caso concreto. É o que já se observa na Solução de Consulta nº 60, de 19 de janeiro de 2017, que utilizou a SD nº 1 como fundamento, mesmo tratando da situação de uma empresa agenciadora de cargas para transporte ao exterior que recebia pagamentos no Brasil de representantes/intermediários de seus clientes estrangeiros.
II.6 Cosit publica Soluções de Divergência sobre Créditos de IPI
A Cosit publicou em janeiro três Soluções de Divergência (SD) orientando os contribuintes acerca da natureza do crédito do IPI.
As soluções nº 6 e 7 dispõem que o benefício de manutenção do crédito de IPI proveniente da aquisição interna de produto em seguida exportado, estabelecido pelo art. 1º, inciso I, do Decreto-Lei nº 1.894, de 16 de dezembro de 1981, não terá natureza tributária, mas de crédito financeiro, sempre que for oriundo de operação em que o beneficiário não atua como contribuinte do IPI.
Com isso, a empresa comercial que adquire produtos de fabricação nacional tributados no mercado interno e os exporta contra pagamento em moeda estrangeira conversível faz jus ao crédito financeiro em montante equivalente ao IPI que consta na nota fiscal de venda emitida pelo comerciante contribuinte do imposto.
Na situação em que os produtos são adquiridos de comerciante não contribuinte do IPI, haverá direito ao crédito quando o imposto tiver incidido na última saída do produto do estabelecimento industrial ou equiparado a industrial. Nesse caso, o adquirente exportador terá direito ao montante do IPI igual ao que houver sido pago em tal última saída.
A SD nº 7/17 também dispõe que por não possuir natureza tributária, o benefício fiscal está desvinculado da sistemática do IPI. O aproveitamento dos créditos dependerá de legislação superveniente.
Já a Solução de Divergência nº 9 determina que as aquisições por estabelecimento industrial de matéria prima, produto intermediário e material de embalagem com notação “NT” na Tabela de Incidência do IPI (TIPI), oriundos de estabelecimento atacadista não contribuinte do IPI, não dão direito ao crédito previsto no art. 227 do Decreto nº 7.212, de 15 de junho de 2010 (Regulamento do IPI).
II.7 Cosit publica SDs sobre conceito de insumos para créditos de PIS e Cofins
A Cosit publicou em janeiro oito Soluções de Divergência (SD) orientando os contribuintes sobre o que pode ser considerado insumo para fins de geração de créditos de PIS e Cofins.
As soluções nº 11 e 12 dispõem que, no regime não cumulativo, é possível o creditamento das despesas com partes, peças de reposição e serviços de manutenção em máquinas, equipamentos e veículos que suprem internamente a produção de bens ou a prestação de serviços (transporte interno, dentro do mesmo estabelecimento - incluindo empilhadeiras), bem como os gastos com combustíveis e lubrificantes neles consumidos. Dispõem, entretanto, que as hipóteses não se aplicam para equipamentos e veículos utilizados no transporte de matérias-primas e produtos em elaboração entre estabelecimentos distintos da mesma empresa. Entendem também não ser possível creditar-se dos gastos com frete na aquisição de partes e peças de reposição, ou dos gastos com frete para manutenção de máquinas e equipamentos.
As SD Cosit nº 2 e 5 preveem a possibilidade de apuração de créditos com dispêndios em frete nas operações de venda de produtos sujeitos a cobrança concentrada ou monofásica, desde que se trate de venda de produtos produzidos ou fabricados pela própria pessoa jurídica (inclusive na operação de venda de álcool) e que os custos do frete tenham sido suportados pelo vendedor, sendo vedada a apuração de créditos da contribuição no caso de revenda, exceto na hipótese em que a pessoa jurídica seja produtora ou fabricante desses mesmos produtos e os adquira para revenda de outra pessoa jurídica importadora, produtora ou fabricante.
Ainda segundo as duas soluções, os custos suportados com armazenagem de mercadorias também geram direito a créditos quando estas forem produzidas ou fabricadas pela própria pessoa jurídica ou quando adquiridas para revenda, exceto mercadorias para as quais a contribuição tenha sido exigida anteriormente em razão de substituição tributária ou cobrança concentrada ou monofásica da contribuição, bem como nos gastos com armazenamento de álcool.
No tocante aos gastos com armazenagem e frete nas operações de vendas internacionais, as SD Cosit nº 3, 8 e 13 apontam que tais despesas não geram créditos de PIS e Cofins no regime não cumulativo, ainda que a beneficiária do pagamento seja pessoa jurídica domiciliada no Brasil e que o transporte seja efetuado como parte de contrato global de logística.
Tais soluções relacionam-se às Instruções Normativas (IN) nº 247/02 e 404/04 da Receita, cujo conteúdo encontra-se sob crivo do STJ em julgamento que delimitará o conceito de insumos para fins de creditamento de PIS e Cofins, conforme já mencionado no item II.2 deste Boletim. O resultado da análise do STJ poderá prejudicar a aplicação dos entendimentos manifestados pela Cosit nas soluções de divergência acima comentadas. Até que sobrevenha julgamento favorável aos contribuintes, as SD vincularão a atuação dos auditores fiscais da Receita.