90 anos de Carf

Vinicius Branco 26/02/2014

Às vésperas de completar 90 anos, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), atual denominação da corte responsável pela revisão em segundo grau das exigências de tributos federais, merece uma justa homenagem.

A importância desse tribunal tem aumentado na mesma proporção em que cresce a complexidade de nosso sistema tributário, permitindo a solução de inúmeras controvérsias.

Apesar das constantes críticas ao órgão, não há dúvida de que o recurso ao Carf apresenta vantagens aos contribuintes, a começar pela possibilidade de revisão de matéria que tenha ensejado a exigência fiscal independente do pagamento de custas e da realização de depósito, além de suspender a exigibilidade do crédito tributário durante o período em que perdurar a discussão.

Por contar com julgadores experientes e foco na matéria, o desfecho das disputas costuma ser relativamente rápido, sobretudo se comparado à morosidade do Judiciário.

Sendo um colegiado composto por representantes da administração tributária e da sociedade civil, o Carf é tido como órgão paritário e soberano em suas decisões. Em sua estrutura organizacional, é composto por várias turmas, câmaras e seções com competência distinta em função das matérias, abrangendo tributos diretos, indiretos, aduaneiros, e previdenciários.

Nos últimos anos, grandes avanços foram alcançados pelo Conselho. Cite-se, a título de exemplo, o processo de digitalização dos feitos, a disponibilização de um banco de dados consolidando a farta jurisprudência concebida, o acesso on line as informações processuais de toda a ordem, e a assinatura eletrônica dos acórdãos.

A introdução de novo procedimento para intimação da Fazenda por decurso de prazo representou enorme avanço, impedindo o uso de expedientes menos nobres para evitar a paralisação por tempo indeterminado do processo administrativo, exigindo da Procuradoria da Fazenda Nacional maior dinamismo, organização e eficiência.

Também é digna de aplausos a alteração regimental promovida para restringir a hipótese de recurso especial fazendário aos casos em que seja demonstrada a existência de divergência jurisprudencial, dispensando tratamento equânime às partes no processo.

Apesar dos progressos, muito há a fazer ainda durante o processo de aperfeiçoamento da instituição.

Uma das providências mais reclamadas diz respeito à necessidade de descentralização do Carf. Por estar sediado em Brasília, exige constantes viagens dos representantes legais para realização de sustentações orais e despacho de memoriais, não raro adiadas pelas mais diversas razões, trazendo prejuízos aos representados com os gastos decorrentes de transporte e estadia, e aos respectivos patronos, que poderiam fazer melhor proveito do seu tempo.

A solução parece residir na transferência física dos órgãos julgadores do Carf, que passariam a funcionar no mesmo local em que estão as Superintendências da Receita Federal, permanecendo em Brasília apenas a Câmara Superior de Recursos Fiscais, instância máxima do Conselho. Essa mudança traria economia também à própria administração tributária, que deixaria de arcar com as elevadas despesas de deslocamento dos representantes fazendários, cuja escolha seria feita em função do local de residência.

Outra medida urgente e necessária diz respeito às instalações, precárias e insuficientes para acomodar o público cada vez mais numeroso que se interessa pelos julgamentos, muitos dos quais obrigados a assisti-los em pé.

O regimento do Carf também exige mudanças. A mais importante delas a alteração no regime dos conselheiros representantes dos contribuintes, obrigados a examinar dezenas de processos mensalmente sem nada receber por isso, enquanto os representantes da Fazenda dedicam-se exclusivamente a essa atividade, um evidente desequilíbrio. O correto seria estabelecer remuneração para esses conselheiros, em valor equivalente à atribuída aos representantes da Fazenda, exigindo-se, nesse caso, exclusividade.

A participação de representantes dos contribuintes no exame de admissibilidade de recursos especiais — hoje reservada a representantes da Fazenda Nacional — é fundamental para que se mantenha a relação paritária. Até que essa modificação seja concebida, impõe-se a reintrodução do recurso de agravo, lamentavelmente suprimido.

A gravação das sessões de julgamento também é importante para acabar com dúvidas entre o que foi decidido e o que ficou registrado no acórdão.

Merece ainda reflexão a prevalência do voto de qualidade, sobretudo em matérias relacionadas à aplicação de penalidades. A exigência desse voto para a solução de impasses provocados por empate entre os membros da turma julgadora revela a existência de dúvidas em relação à aplicação de multas. E se existem dúvidas, é de rigor o afastamento de penalidades, prestigiando-se assim o artigo 112 do Código Tributário Nacional, que consagra o “in dubio pro reo”, adotado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da Ação Penal 470.

Desejável ainda o restabelecimento dos julgamentos pelo tribunal pleno para dirimir, na forma de súmulas, divergências entre decisões das respectivas seções.

A maioria daqueles que participam das jornadas no Carf na condição de patronos reconhecem os recentes feitos da atual administração no sentido de aproximar a instituição dos contribuintes, assegurando-lhes o acesso à justiça tributária. Mas muito há a fazer, e para que se consiga chegar ao ideal é imprescindível a contribuição de órgãos de classe, ao lado de representantes da Fazenda Nacional e do próprio Carf.
 

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