Não há dúvida de que quotistas de sociedades limitadas – tipo societário usualmente utilizado por sociedades de agentes autônomos – têm direito de se retirar da sociedade. A questão que se coloca é: por qual valor?
No caso de sociedades limitadas de prazo indeterminado – a situação mais comum –, além de eventuais hipóteses previstas em lei ou contrato, o Código Civil permite a saída a qualquer momento, bastando que o sócio retirante notifique os demais com sessenta dias de antecedência. Tratando-se de sociedade limitada de prazo determinado, o Código Civil, acertadamente, prevê a necessidade de prova judicial da justa causa. Também há previsão legal de direito de retirada, independentemente de haver ou não prazo determinado, em determinadas hipóteses: modificação do contrato social, fusão e incorporação da sociedade.
É possível – e recomendável – prever em contrato os critérios para determinação do valor devido ao sócio retirante. Na ausência de previsão contratual, estabelece a lei que o valor da quota deve ser liquidado com base na situação patrimonial da sociedade.
É bastante comum a previsão, em contratos sociais e/ou acordos de sócios, do levantamento de balancete especial para apuração de haveres do sócio retirante. Adota-se, assim, o valor patrimonial, que tende a ser relativamente baixo e não refletir o valor da empresa, especialmente em negócios cujos lucros são regularmente distribuídos, como o de agentes autônomos, e cujo principal ativo é a carteira de clientes. A adoção do critério patrimonial, portanto, serve como desincentivo à saída da sociedade.
Como contraponto ao critério patrimonial, temos a indicação do critério econômico, usualmente atrelado à avaliação da sociedade pelo método do fluxo de caixa descontado, que, resumidamente, busca atribuir valor à empresa levando em consideração a estimativa de fluxo de caixa futuro, descontada a valor presente por taxa que reflita o custo de capital.
O critério econômico não é adequado para sociedades cujo fluxo de caixa é vinculado aos sócios e não à empresa. De qualquer forma, se adotado, cláusula deveria vir atrelada a acordo do retirante de não aceitar atender clientes da antiga sociedade por um prazo mínimo após sua saída, afinal seria a permanência deles na sociedade o fundamento do pagamento de valor adicional em relação ao contábil. Isso não garante que os clientes permanecerão na sociedade, mas ao menos mitiga o risco de saída.
Não é incomum a instauração de conflito quanto ao valor devido ao sócio retirante. O Poder Judiciário e tribunais arbitrais, conforme aplicável, são chamados a resolver o impasse, principalmente quando as cláusulas contratuais não são claras e não se sustentam do ponto de vista econômico.
De modo geral, faz sentido a opção pelo critério patrimonial, com a ressalva acima feita de não desvio de clientela, dado que a preservação da sociedade deveria prevalecer sobre a decisão unilateral de determinado quotista se retirar. A decisão de saída não deveria inviabilizar a continuidade do negócio; a opção de, a qualquer momento e independentemente de causa, simplesmente desfazer o vínculo societário em sociedades de agentes autônomos não deveria ser economicamente atrativa.
Embora a perspectiva patrimonial seja usualmente utilizada, há situações que merecem avaliação mais cuidadosa. Por exemplo, no caso da saída de sócio que pretende deixar de atuar profissionalmente como agente autônomo. A “aposentadoria” de agentes autônomos poderia considerar o valor dos anos de dedicação ao negócio e a carteira de clientes gerada pelo retirante, que, inclusive, tem o potencial de continuar a gerar receitas para a sociedade. Ao invés de receber o valor contábil de suas quotas – usualmente pouco relevante –, ou o valor econômico da sua participação – mais justificável no caso de empresas que menos dependam do esforço individual dos sócios –, pode fazer sentido uma alternativa intermediária, em que o sócio retirante receba por suas quotas valor que tenha relação mais direta com a carteira de clientes por ele captada. Algo escalonado ao longo de alguns anos, de modo que o sócio retirante tenha direito a percentual decrescente dos lucros à medida em que faz a transição da carteira para seu sucessor na empresa.
Outros modelos e critérios podem e devem ser avaliados. Importante que haja previsão de regra clara e objetiva, que faça sentido do ponto de vista econômico, e reduza espaço para contencioso. Idealmente, regra que não dependa de interpretação e facilite a rápida solução do impasse. Regras bem escritas, acordadas em boa-fé, e que não contrariem dispositivos legais tenderão a prevalecer, em respeito à autonomia privada e liberdade contratual.
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