CVM 'aprova' ágio em transação intragrupo na Mahle

09/05/2011

Os acionistas controladores não costumam gostar que os minoritários votem decisões importantes para suas companhias. Mas a Mahle Metal Leve tirou proveito disso ao conseguir contabilizar ágio em uma recente reorganização societária envolvendo empresa do mesmo grupo. E com consentimento da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Pelo fato de a operação ter sido aprovada pelos minoritários da Mahle, os diretores do órgão regulador aceitaram o argumento de que a transação não foi feita entre partes relacionadas. Assim, a Mahle foi autorizada a reconhecer ágio na aquisição da Mahle Participações, que tinha ativos do segmento de motores, sendo que ambas são controladas pela empresa alemã Mahle GmBH. A reorganização foi feita no âmbito do processo de migração da companhia para o Novo Mercado.

Antes de fazer o registro contábil, a Mahle Metal Leve, que é a companhia de capital aberto no Brasil, consultou a CVM. A superintendência de relações com empresas do órgão regulador entendeu que o ágio não poderia ser reconhecido. Após recurso, a diretoria da autarquia reformou a decisão da área técnica.

Segundo o relator, Otavio Yazbek, o objeto da discussão não eram as demonstrações financeiras consolidadas da matriz alemã, mas sim o balanço da companhia Mahle no Brasil.

Ele ressaltou que, do ponto de vista dessa segunda empresa, "a reestruturação resultou em ganho patrimonial, visto que recebeu em contrapartida um ativo que antes não possuía". Yazbek destacou ainda que, tendo em vista o pronunciamento contábil CPC 15, que trata de fusões e aquisições, as partes que deliberaram a operação não podem ser caracterizadas como relacionadas, acrescentando que os minoritários votaram sozinhos e participaram do "processo negocial".

O diretor Alexsandro Broedel, especialista em contabilidade, também apresentou voto com o mesmo entendimento. Para ele, se fosse seguido o entendimento da área técnica, de que o ágio teria que ser baixado, haveria "a situação absurda de uma redução patrimonial ocasionada pela aquisição de uma companhia por outra. Isso não faz sentido".

A conclusão da CVM, sem dúvida, deve agradar o mundo empresarial, já que a existência do ágio pode permitir benefícios fiscais, ainda que seu uso não seja bem aceito pela Receita Federal mesmo em casos mais simples.

Mas vale o alerta feito por Yazbek logo no primeiro parágrafo do seu voto. "Tendo em vista que a interpretação que reputo mais adequada se apoia sobre as peculiaridades do caso concreto, não me parece possível tirar uma orientação mais abrangente, ou mesmo uma linha que a área técnica deva privilegiar em casos futuros", diz o diretor da CVM.

Broedel faz a mesma ressalva, ao dizer que a "decisão somente aplica-se ao caso concreto, onde não restaram dúvidas de que a transação se deu sem a participação dos acionistas controladores, que se abstiveram de votar".

"O sonho de todo mundo é que o ágio gerado dentro de casa possa ser usado para fins tributários", afirma Isabela Schenberg Frascino, sócia de direito tributário do Levy & Salomão. Mas ela é bastante cética quando questionada sobre se há chance de o Fisco concordar com a visão da CVM: "Provavelmente não".

Daniel Tardelli Pessoa, da área societária do Levy & Salomão, diz que o que a CVM fez foi "abrir o conceito" sobre o que é ou não parte relacionada. "Mas parece mesmo uma decisao feita para o caso específico", afirma, destacando que os documentos públicos não permitiram que ele próprio chegasse a uma conclusão.

Daniella Fragoso, advogada do escritório Barbosa, Müssnich & Aragão, afirma que não se trata de uma operação clássica. "Parece que o caso tinha que ser tratado de um jeito diferente." Para ela, o entendimento é positivo para o mercado, porque quem ganha é a companhia toda, e não apenas os controladores. Ela acha importante também a sinalização da CVM. "Toda decisão inusitada acaba colaborando dessa forma", afirma.

Fernando Torres

Valor Econômico, Eu & Investimentos

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