A maioria das pessoas já ouviu falar da busca do célebre sapateiro francês pela exclusividade no uso de solados vermelhos; ou da disputa societária entre os herdeiros do criador das camisas que levam o mesmo nome do esporte que as consagrou; ou da briga judicial entre uma grife brasileira e uma francesa em razão da comercialização de bolsas de moletom que imitam modelo icônico, batizado com o nome da atriz e cantora inglesa que o inspirou; ou, ainda, da autuação de uma rede de fast-fashion espanhola com forte presença no Brasil por irregularidades com trabalhadores.
O que poucos sabem é que esses são casos típicos do chamado fashion law (ou, no português, direito da moda). Não chega a ser, como querem alguns, uma área especializada do Direito, mas sim a aplicação dos já conhecidos ramos do Direito a questões legais peculiares que envolvem a indústria da moda, do início ao fim da cadeia produtiva.
Têm relevância para o fashion law o direito civil, o direito comercial, o direito tributário, o direito concorrencial, o direito do comércio internacional, o direito societário, o direito imobiliário, o direito trabalhista, o direito processual etc., mas é o direito da propriedade intelectual a principal especialidade quando se fala em fashion law, seja na modalidade da propriedade industrial, seja na modalidade do direito autoral.
É certo que a crescente importância para a economia do mercado da moda e a facilidade de se reproduzir um artigo sem autorização daquele que detém sua propriedade intelectual, a chamada contrafação (por vezes disfarçada de “inspiração”), atraíram o olhar mais atento dos players desse mercado e também dos advogados.
A preocupação com a visão do direito da moda, como uma área multidisciplinar, a exigir conhecimento específico, surgiu na Europa em meados da década de 2000 e logo se propagou pelos Estados Unidos. No exterior o debate sobre a importância do tema já alcançou estágio bastante adiantado, inclusive com a iniciativa de um estado norte-americano de propor a edição de uma lei com regulamentação específica visando à proteção dos bens de consumo relacionados ao mercado da moda.
Agora, o fenômeno se faz sentir no Brasil, aumentando a demanda por uma assessoria especializada. São basicamente dois os motivos que levaram a tanto: a crescente instalação de grifes de luxo estrangeiras no país e a profissionalização da moda brasileira – o São Paulo Fashion Week, por exemplo, é hoje o maior evento de moda da América Latina e atrai a atenção da mídia do mundo todo.
Embora ainda sejam poucos os casos que chegam ao Judiciário, lidar com as intrincadas questões jurídicas que se apresentam exige conhecimento profundo dos ramos da propriedade intelectual, mais especificamente a proteção às marcas e às criações, e a concorrência desleal.
Tudo indica que, aos poucos, o direito da moda assumirá posição de destaque igualmente no Brasil, e que nossas Cortes criarão jurisprudência genuinamente nacional em torno do tema. Espera-se que as decisões sejam coerentes com nosso arcabouço legal e dadas em tempo apropriado para acompanhar as transformações do dinâmico mercado da moda. Que as tendências de moda sejam efêmeras, mas que a proteção do mercado em si – e das criações de moda que o movimentam – dure mais que uma estação.